Estratégia de geoconservação.
Geoparques e Geoturismo.
1.Introdução.
Apreciar
a natureza é coisa antiga. Praticamente desde que existem registos escritos que
podemos encontrar referências mais ou menos elogiosas á natureza, que por vezes
ultrapassam a visão utilitarista. Contudo, estas referências raramente abordam
conceitos geológicos, fundamentalmente porque estes só começaram a ganhar
espaço entre o fim do século XVIII e o início do século XIX. Manda a verdade
que se afirme que desde meados do século XIX que existem alguns autores que
escreveram apreciativamente sobre o meio abiótico chegando a revelar algumas
preocupações com a sua conservação. Após o final da Segunda Guerra Mundial
houve grandes transformações, inicialmente incipientes, mas que foram
acelerando e transformaram-se numa verdadeira revolução a partir da década de
sessenta, alterando radicalmente velhos conceitos e criando novos paradigmas.
Entre estes está o que simplisticamente apelidamos de “consciência ecológica”,
incluindo, entre outros aspetos, a valorização da conservação e o uso racional,
tendencialmente sustentável, do ambiente. Esta visão já se cimentou, há várias
décadas no que se refere á biodiversidade; já quanto á geodiversidade só
recentemente ganhou a sua carta de alforria. (Mantesso-Neto, V., s.d.)
Finalmente está a considerar-se e a entender-se algumas das ideias atribuídas
(parece que erradamente) ao chefe Seattle, no final do século XIX: “Somos parte
da terra e ela é parte de nós… De uma coisa sabemos. A terra não pertence ao
homem: é o homem que pertence á terra. (Seattle, 1854, citado por Mantesso-Neto,
V., s.d.)
No
que respeita a Portugal, as primeiras preocupações de que há notícia com a Proteção
da Natureza datam de 1911, ano em que foi criada a Associação Protetora da
Árvore, pequena associação privada, criada para a preservação de exemplares
notáveis de árvores (Neves, 1970, citado por Brilha, 2005). Face aos objetivos
não estranha que este movimento tenha sido liderado por engenheiros
silvicultores, se bem que tenha evoluído para a proteção da natureza,
considerando a necessidade de proteger tanto os valores biológicos como os
geológicos. De acordo com Flores (1939), citado por Brilha, entre a época
medieval e o século XVIII a proteção da natureza era principalmente
utilitarista; a partir do século XIX passou a ser considerada esteticamente; no
século XX os critérios passaram a ser científicos. (Brilha, 2005)
2.Estratégia de geoconservação.
Tal
como aconteceu com o termo Geodiversidade, devido a ser um termo relativamente
recente, também no que respeita á Geoconservação não há muito consenso no que
respeita à sua definição. Sharples (2002), citado por Brilha (2005) tenta
concertar uma definição de geoconservação, como segue: A Geoconservação tem como objetivo a preservação da diversidade
natural (ou geodiversidade) de significativos aspetos e processos geológicos
(substrato), geomorfológicos (forma da paisagem) e de solo, mantendo a evolução
natural (velocidade e intensidade) desses aspetos e processos. Esta visão
de geoconservação é consentânea com a definição de geodiversidade que
apresentei no “post” anterior (conceito de geodiversidade) sendo fundamental
para a biodiversidade e também porque a geodiversidade possui valor intrínseco,
isto é, valor por si próprio, mesmo que não se encontre ligado a qualquer forma
de vida. Em sentido lato, a geoconservação tem como objetivo a gestão
sustentável e a utilização de toda a geodiversidade, considerando todos os
recursos geológicos. Restritamente aponta apenas para a conservação de alguns
elementos da geodiversidade que testemunham valor acima da média. Uma coisa é
estabelecer ações para garantir a gestão sustentada dos recursos geológicos,
outra, bem diferente, consiste na concretização de ações que possibilitem a
conservação de aflorações geológicas possuidoras de indesmentível valor
científico, pedagógico, cultural, turístico, ou outros, os geossítios. São o conjunto destes que habitualmente se designa
por Património Geológico. (Brilha,
J., 2005)
Para
montar a rede de geossítios é necessário:
Começar
por proceder á sua inventariação (levantamento
sistemático da área, identificação das ocorrências, definição da tipologia,
referenciação geográfica e fotográfica, breve caracterização de campo);
Seguidamente
fazer a quantificação (com base numa
escala de 1 a 5) dos critérios
relevantes, ou intrínsecos (inerentes ao próprio sítio);
Depois indicar os critérios relacionados com o uso potencial do geossítio (possibilidade de realizar atividades e quais,
condições de observação de aspetos particulares, possibilidade de recolher
amostras geológicas, facilidade/dificuldade de acesso, proximidade de
habitações c/ número de habitantes e condições socioeconómicas do meio);
Estabelecer
os critérios relacionados com a
necessidade de proteção (ameaças atuais e potencial, situação atual,
relação com a exploração mineira, valoração dos terrenos, tipo e regime de
propriedade, eventuais fragilidades);
Definir
possíveis processos de classificação (enquadramento
legal e estatuto-nacional, regional ou local). (Adaptado de Brilha, 2005)
Uma
vez estabelecidos os vários geossítios é necessário proceder á sua conservação, avaliando continuamente a
sua vulnerabilidade face á degradação introduzida por fatores naturais ou
antrópicos e proceder á sua valorização
e divulgação. Entende-se por valorização
as ações propostas para informar e interpretar e que vão ajudar os futuros
visitantes a compreender os valores em causa enquanto a divulgação pode ser promovida recorrendo a ações especificas,
conjugadas com outras tendentes a
promover o património cultural e natural. (Adaptado de Brilha, 2005)
Finalmente
é necessário fazer a monitorização
periódica, criando estratégias que permitam quantificar a evolução ao longo dos
anos (perda ou ganho de relevância) e definindo ações de manutenção que
fortaleçam a sua inserção no meio. (Adaptado de Brilha, 2005)
3. Geoparques.
A
noção de geoparque é um conceito muito recente (2000) e não é um parque no
verdadeiro sentido do termo nem estritamente geológico, tendo contudo uma
componente geológica, materializada nos geossítios, que constituem afloramentos
com valores abióticos especiais, tal como indicado no ponto anterior. O
geoparque é um conceito filosófico “holístico de respeito, valorização e
conservação da natureza”, assente nas suas componentes geológicas e constitui
um território geograficamente definido, com vários geossítios. (Mantesso-Neto,
V., s.d.)
A
Europa criou em 2000 uma Rede de Geoparques (REG), formada por quatro
geoparques, rede apoiada pela UNESCO a partir de 2001. Atualmente esta REG
distribuiu-se por dezassete países com 43 geoparques. Também já está instalada
a Rede Global de Geoparques (RGG), criada em 2004, também com o apoio da
UNESCO, tendo como principal objetivo a integração de todos os geoparques
existentes no mundo. Em Portugal há várias zonas de interesse em termos de
geodiversidade. Devido á limitação de espaço vou referir apenas dois, o
Naturtejo e o Arouca, existindo outros projetos com interesse e em instalação.
O Geopark Naturtejo da Meseta Meridional foi o primeiro geoparque nacional e
integrou em 2006 as Redes Europeias e Global de Geoparques. A sua área é de
4616 km2, nos concelhos de Castelo Branco, Idanha-a-Nova, Proença-a-Nova, Nisa,
Oleiros e Vila Velha de Ródão e as suas prioridades são a geoconservação, a
educação, o geoturismo, tendo como base um património geológico incomparável. (Geopark
Naturtejo)
Também
o Arouca Geopark é um território especial da REG e da RGG (2009). Está presente
num único concelho com uma área de 328 Km2, reunindo neste espaço um valioso
património geológico, importantes recursos biológicos e vestígios patrimoniais
históricos e culturais. Território de mistério e aventura, abarcando os fundos
dos vales dos rios Arda e Paiva com cotas inferiores a duzentos metros e os
topos das serras da Freita e de Montemuro com mais de mil metros de altitude é
guardião das maiores trilobites conhecidas e das misteriosas “pedras
parideiras” para além doutras preciosidades que constituem objetivos
primordiais, como a frecha da Mizarela a mais alta queda existente em
território português continental sendo um dos geossítios mais extraordinários
do Arouca Geopark. (Carmona, P., 2013)
4.Geoturismo.
O
geoturismo, tal como todos os anteriores conceitos é uma nova modalidade, neste
caso do turismo, praticado em geoparques (agregação de geossítios). Foi
definido, pela primeira vez, por Thomas Hose numa revista da especialidade,
como: “a provisão de serviços e facilidades interpretativas que permitam aos
turistas adquirirem conhecimento e entendimento sobre a geologia e
geomorfologia de um sítio (incluindo sua contribuição para o desenvolvimento
das Ciências da Terra), além da mera apreciação estética (Hose, 2008, p, 221,
citado por Lopes, L., 2011). Segundo Gates, 2008, p. 157 (citado por Lopes, L.,
2001) “geoturismo é um termo novo para uma ideia relativamente antiga e como
tal apresenta definições conflituantes”. Como conceito relativamente recente
existem várias controvérsias sobre o termo, mas a maior parte dos pesquisadores
concorda que o prefixo “geo” se refere à geologia, sendo que o geoturismo é uma
atividade turística com o foco nos locais de interesse geológico. Este recente
segmento turístico promove a educação ambiental (integrando observações da
biodiversidade, geodiversidade e património histórico e cultural, sempre que
existam) por meio de atividades de interpretação, recorrendo a vários meios e
potenciando o desenvolvimento sustentável das populações autóctones. (Lopes,
L., et al, 2011)
Referências Bibliográficas:
Brilha,
J., (2005). Património Geológico e
Conservação. A Conservação da Natureza na sua vertente Geológica. Palimage,
Imagem Palavra. Braga.
Carmona,
P., (2013). National Geographic, Portugal.
O Trilho da Terra
Estratégias
de geoconservação. Adaptado de Brilha (2005)
Lopes,
L., Araújo, L., Castro, A. (2011). Geoturismo: Estratégia de Geoconservação e
de Desenvolvimento Local. Caderno de
Geografia. v.21, n.º 35.
Mantesso-Neto,
V. (s.d.). Geodiversidade, Geoconservação, Geoturismo, Património Geológico,
Geoparques: Novos conceitos nas geociências do século XXI. Conselho Estadual de
Monumentos Geológicos, SP – virginio@uol.com.br. Acedido em 14/05/2013.
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