quinta-feira, 16 de maio de 2013


Estratégia de geoconservação.

Geoparques e Geoturismo.

1.Introdução.

Apreciar a natureza é coisa antiga. Praticamente desde que existem registos escritos que podemos encontrar referências mais ou menos elogiosas á natureza, que por vezes ultrapassam a visão utilitarista. Contudo, estas referências raramente abordam conceitos geológicos, fundamentalmente porque estes só começaram a ganhar espaço entre o fim do século XVIII e o início do século XIX. Manda a verdade que se afirme que desde meados do século XIX que existem alguns autores que escreveram apreciativamente sobre o meio abiótico chegando a revelar algumas preocupações com a sua conservação. Após o final da Segunda Guerra Mundial houve grandes transformações, inicialmente incipientes, mas que foram acelerando e transformaram-se numa verdadeira revolução a partir da década de sessenta, alterando radicalmente velhos conceitos e criando novos paradigmas. Entre estes está o que simplisticamente apelidamos de “consciência ecológica”, incluindo, entre outros aspetos, a valorização da conservação e o uso racional, tendencialmente sustentável, do ambiente. Esta visão já se cimentou, há várias décadas no que se refere á biodiversidade; já quanto á geodiversidade só recentemente ganhou a sua carta de alforria. (Mantesso-Neto, V., s.d.) Finalmente está a considerar-se e a entender-se algumas das ideias atribuídas (parece que erradamente) ao chefe Seattle, no final do século XIX: “Somos parte da terra e ela é parte de nós… De uma coisa sabemos. A terra não pertence ao homem: é o homem que pertence á terra. (Seattle, 1854, citado por Mantesso-Neto, V., s.d.)

No que respeita a Portugal, as primeiras preocupações de que há notícia com a Proteção da Natureza datam de 1911, ano em que foi criada a Associação Protetora da Árvore, pequena associação privada, criada para a preservação de exemplares notáveis de árvores (Neves, 1970, citado por Brilha, 2005). Face aos objetivos não estranha que este movimento tenha sido liderado por engenheiros silvicultores, se bem que tenha evoluído para a proteção da natureza, considerando a necessidade de proteger tanto os valores biológicos como os geológicos. De acordo com Flores (1939), citado por Brilha, entre a época medieval e o século XVIII a proteção da natureza era principalmente utilitarista; a partir do século XIX passou a ser considerada esteticamente; no século XX os critérios passaram a ser científicos. (Brilha, 2005)

2.Estratégia de geoconservação.

Tal como aconteceu com o termo Geodiversidade, devido a ser um termo relativamente recente, também no que respeita á Geoconservação não há muito consenso no que respeita à sua definição. Sharples (2002), citado por Brilha (2005) tenta concertar uma definição de geoconservação, como segue: A Geoconservação tem como objetivo a preservação da diversidade natural (ou geodiversidade) de significativos aspetos e processos geológicos (substrato), geomorfológicos (forma da paisagem) e de solo, mantendo a evolução natural (velocidade e intensidade) desses aspetos e processos. Esta visão de geoconservação é consentânea com a definição de geodiversidade que apresentei no “post” anterior (conceito de geodiversidade) sendo fundamental para a biodiversidade e também porque a geodiversidade possui valor intrínseco, isto é, valor por si próprio, mesmo que não se encontre ligado a qualquer forma de vida. Em sentido lato, a geoconservação tem como objetivo a gestão sustentável e a utilização de toda a geodiversidade, considerando todos os recursos geológicos. Restritamente aponta apenas para a conservação de alguns elementos da geodiversidade que testemunham valor acima da média. Uma coisa é estabelecer ações para garantir a gestão sustentada dos recursos geológicos, outra, bem diferente, consiste na concretização de ações que possibilitem a conservação de aflorações geológicas possuidoras de indesmentível valor científico, pedagógico, cultural, turístico, ou outros, os geossítios. São o conjunto destes que habitualmente se designa por Património Geológico. (Brilha, J., 2005)

Para montar a rede de geossítios é necessário:

Começar por proceder á sua inventariação (levantamento sistemático da área, identificação das ocorrências, definição da tipologia, referenciação geográfica e fotográfica, breve caracterização de campo);

Seguidamente fazer a quantificação (com base numa escala de 1 a 5) dos critérios relevantes, ou intrínsecos (inerentes ao próprio sítio);

Depois indicar os critérios relacionados com o uso potencial do geossítio (possibilidade de realizar atividades e quais, condições de observação de aspetos particulares, possibilidade de recolher amostras geológicas, facilidade/dificuldade de acesso, proximidade de habitações c/ número de habitantes e condições socioeconómicas do meio);

Estabelecer os critérios relacionados com a necessidade de proteção (ameaças atuais e potencial, situação atual, relação com a exploração mineira, valoração dos terrenos, tipo e regime de propriedade, eventuais fragilidades);

Definir possíveis processos de classificação (enquadramento legal e estatuto-nacional, regional ou local). (Adaptado de Brilha, 2005)

Uma vez estabelecidos os vários geossítios é necessário proceder á sua conservação, avaliando continuamente a sua vulnerabilidade face á degradação introduzida por fatores naturais ou antrópicos e proceder á sua valorização e divulgação. Entende-se por valorização as ações propostas para informar e interpretar e que vão ajudar os futuros visitantes a compreender os valores em causa enquanto a divulgação pode ser promovida recorrendo a ações especificas, conjugadas com outras tendentes a promover o património cultural e natural. (Adaptado de Brilha, 2005)

Finalmente é necessário fazer a monitorização periódica, criando estratégias que permitam quantificar a evolução ao longo dos anos (perda ou ganho de relevância) e definindo ações de manutenção que fortaleçam a sua inserção no meio. (Adaptado de Brilha, 2005)

3. Geoparques.

A noção de geoparque é um conceito muito recente (2000) e não é um parque no verdadeiro sentido do termo nem estritamente geológico, tendo contudo uma componente geológica, materializada nos geossítios, que constituem afloramentos com valores abióticos especiais, tal como indicado no ponto anterior. O geoparque é um conceito filosófico “holístico de respeito, valorização e conservação da natureza”, assente nas suas componentes geológicas e constitui um território geograficamente definido, com vários geossítios. (Mantesso-Neto, V., s.d.)

A Europa criou em 2000 uma Rede de Geoparques (REG), formada por quatro geoparques, rede apoiada pela UNESCO a partir de 2001. Atualmente esta REG distribuiu-se por dezassete países com 43 geoparques. Também já está instalada a Rede Global de Geoparques (RGG), criada em 2004, também com o apoio da UNESCO, tendo como principal objetivo a integração de todos os geoparques existentes no mundo. Em Portugal há várias zonas de interesse em termos de geodiversidade. Devido á limitação de espaço vou referir apenas dois, o Naturtejo e o Arouca, existindo outros projetos com interesse e em instalação. O Geopark Naturtejo da Meseta Meridional foi o primeiro geoparque nacional e integrou em 2006 as Redes Europeias e Global de Geoparques. A sua área é de 4616 km2, nos concelhos de Castelo Branco, Idanha-a-Nova, Proença-a-Nova, Nisa, Oleiros e Vila Velha de Ródão e as suas prioridades são a geoconservação, a educação, o geoturismo, tendo como base um património geológico incomparável. (Geopark Naturtejo)

Também o Arouca Geopark é um território especial da REG e da RGG (2009). Está presente num único concelho com uma área de 328 Km2, reunindo neste espaço um valioso património geológico, importantes recursos biológicos e vestígios patrimoniais históricos e culturais. Território de mistério e aventura, abarcando os fundos dos vales dos rios Arda e Paiva com cotas inferiores a duzentos metros e os topos das serras da Freita e de Montemuro com mais de mil metros de altitude é guardião das maiores trilobites conhecidas e das misteriosas “pedras parideiras” para além doutras preciosidades que constituem objetivos primordiais, como a frecha da Mizarela a mais alta queda existente em território português continental sendo um dos geossítios mais extraordinários do Arouca Geopark. (Carmona, P., 2013)

4.Geoturismo.

O geoturismo, tal como todos os anteriores conceitos é uma nova modalidade, neste caso do turismo, praticado em geoparques (agregação de geossítios). Foi definido, pela primeira vez, por Thomas Hose numa revista da especialidade, como: “a provisão de serviços e facilidades interpretativas que permitam aos turistas adquirirem conhecimento e entendimento sobre a geologia e geomorfologia de um sítio (incluindo sua contribuição para o desenvolvimento das Ciências da Terra), além da mera apreciação estética (Hose, 2008, p, 221, citado por Lopes, L., 2011). Segundo Gates, 2008, p. 157 (citado por Lopes, L., 2001) “geoturismo é um termo novo para uma ideia relativamente antiga e como tal apresenta definições conflituantes”. Como conceito relativamente recente existem várias controvérsias sobre o termo, mas a maior parte dos pesquisadores concorda que o prefixo “geo” se refere à geologia, sendo que o geoturismo é uma atividade turística com o foco nos locais de interesse geológico. Este recente segmento turístico promove a educação ambiental (integrando observações da biodiversidade, geodiversidade e património histórico e cultural, sempre que existam) por meio de atividades de interpretação, recorrendo a vários meios e potenciando o desenvolvimento sustentável das populações autóctones. (Lopes, L., et al, 2011)

 

Referências Bibliográficas:

Brilha, J., (2005). Património Geológico e Conservação. A Conservação da Natureza na sua vertente Geológica. Palimage, Imagem Palavra. Braga.

Carmona, P., (2013). National Geographic, Portugal. O Trilho da Terra

Estratégias de geoconservação. Adaptado de Brilha (2005)

Geopark Naturtejo, http://www.naturtejo.com/conteudo.php?id=2 . Acedido em 15/05/2013).

Lopes, L., Araújo, L., Castro, A. (2011). Geoturismo: Estratégia de Geoconservação e de Desenvolvimento Local. Caderno de Geografia. v.21, n.º 35.

Mantesso-Neto, V. (s.d.). Geodiversidade, Geoconservação, Geoturismo, Património Geológico, Geoparques: Novos conceitos nas geociências do século XXI. Conselho Estadual de Monumentos Geológicos, SP – virginio@uol.com.br. Acedido em 14/05/2013.

 

 

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